16.7.04
A minha posição em relação ao aborto
Vou tentar exprimir nas palavras que se seguem o porquê de eu ser a favor do aborto por razões "sociais" (já que nem vou discutir o aborto que se deve a violação/malformação/perigo para a mãe), a partir do momento que este siga algumas (poucas) regras, mas porque sou contra a sua introdução neste momento em Portugal.
O único julgamento moral que faço em relação ao aborto é de que ele deverá ser feito somente em última instância. Em particular nunca deverá ser permitida a sua utilização como método contraceptivo, mesmo que seja executado quimicamente. Só deverá ser utilizado por razões sociais para ultrapassar a incidência estatística de problemas e ineficácias intrínsecas aos métodos contraceptivos. Tendo estas considerações em conta, acho que de resto deverá ser completamente livre até ao limite de tempo de gestação clinicamente aceito como podendo suportar a sobrevivência autónoma do feto (fora do organismo da mãe), e deverá ser comparticipado (a haver mecanismos de comparticipação) como cuidado de saúde primário.
Acredito que a visão legal do problema deveria ser completamente separada da perspectiva religiosa e moral da questão. O Estado deve, quanto a mim, permitir às pessoas exprimir as suas crenças, mas não sancioná-las ou julgá-las para além das regras básicas de convivência em Sociedade. Deve permitir com total liberdade que pessoas que pensam de modo diferente relativamente a um determinado assunto possam exercer a sua vontade com igualdade. O facto de a questão e do condicionalismo religioso relativamente ao instante de início da Vida existir não deverá constituir um fardo para o Estado e para a Lei. Uma solução de denominador comum tem que ser atingida, e eu acredito que passa pelo referido critério de sobrevivência do feto. Caso haja pessoas que decidam por instantes anteriores a esse, até à propria concepção, tal deverá constituir uma decisão livre e pessoal ao seu dispôr.
Mas subsiste um ponto de vista que julgo até agora não ter sido particularmente aflorado e discutido, e que se prende com a participação do pai em todo o processo de aborto. A perspectiva comum de que "o corpo é da mulher e ela é que tem a decisão", e que "a escolha é dela" negligencia, quanto a mim, o papel e os direitos do pai em todo o processo. Apesar de todas as considerações que se possam tomar, materialmente a gravidez envolve tanto os genes do pai como os da mãe. O objecto da gravidez não é um produto exclusivo da mãe, constituíndo património genético dos dois. Defendo que também ao pai cabem direitos relativos ao curso da gravidez. Quanto a mim, deveria existir uma determinação legal que estabelecesse e obrigatoriedade de o pai ser informado da gravidez e, adicionalmente, da vontade da mulher fazer um aborto. Ao pai, assim como à mãe, deveria ser conferida a possibilidade de pedir que o aborto fosse efectuado. Caso o pai não autorize o aborto e a mulher opte por prosseguir com ele, ou caso ele peça que ele seja efectuado e tal lhe seja negado, julgo que tal deveria constituir fundamentação legal suficiente para que ele seja ilibado de quaisquer responsabilidades futuras relativas à criança (nomeadamente pensões de alimentos), bem como ser fundamentação para indeminização e/ou divórcio. Obviamente tal também seria o caso inverso, em que à mãe fosse negada a possibilidade de fazer o aborto (sendo que as responsabilidades inerentes à criança seriam automaticamente conferidas ao pai, mantendo-se o mesmo raciocínio relativamente ao divórcio/indeminização).
Em relação a Portugal, as coisas são diferentes. O problema é que, neste país, as lacunas relativas à disseminação dos métodos de contracepção, e mesmo no que toca à educação média dos cidadãos propriamente ditos são graves. O conhecimento e acesso aos métodos contraceptivos não é, para ser brando, muito disseminado e acessível. Temos uma das maiores taxas de gravidez na adolescência da Europa. Não existe educação sexual oficial. A Igreja Católica assume ainda, em termos de moral e cânone, uma forte influência na Sociedade, simultaneamente promovendo a "defesa da vida" e negando os mais básicos procedimentos de controle da natalidade. A cultura de irresponsabilidade e laxismo bem típica do português em relação à contracepção faz de Portugal um dos mercados de maior sucesso para a "pílula do dia seguinte". Simplesmente abrir a porta ao aborto livre, especialmente se for tomada em conta a possibilidade de ele ser feito quimicamente, seria simplesmente criar um novo tipo de "contracepção de emergência", ou pelo menos creio que seria visto como tal por grande parte das pessoas. Quanto a mim, tal não pode ser tolerado. As pessoas têm que ser educadas e ter capacidade de aceder à contracepção antes que se coloque semelhante escolha. Se for conferida às pessoas a possibilidade de utilizarem este "martelo", todos os problemas começarão a ser vistos como "pregos".
Isto não significa que concorde com a actual criminalização constante da Lei. O conceito de crime deveria estar, quanto a mim, restrito a quem efectua o acto do aborto, e não às mulheres que deles são vítimas. A penalização destes deverá permanecer pesada, e principalmente ser efectivada pelos senhores juízes. Em relação às mulheres, julgo que o procedimento deveria passar por uma multa, comutável em trabalho comunitário.
Até que se tenha educado melhor os nossos concidadãos, e que as estatísticas se aproximem mais dos nossos parceiros europeus, o salto não poderá ser dado, e a questão deverá ser tratada como um problema de saúde pública, devendo ser impiedosa a punição dos que aproveitam e exploram a infelicidade alheia.
O único julgamento moral que faço em relação ao aborto é de que ele deverá ser feito somente em última instância. Em particular nunca deverá ser permitida a sua utilização como método contraceptivo, mesmo que seja executado quimicamente. Só deverá ser utilizado por razões sociais para ultrapassar a incidência estatística de problemas e ineficácias intrínsecas aos métodos contraceptivos. Tendo estas considerações em conta, acho que de resto deverá ser completamente livre até ao limite de tempo de gestação clinicamente aceito como podendo suportar a sobrevivência autónoma do feto (fora do organismo da mãe), e deverá ser comparticipado (a haver mecanismos de comparticipação) como cuidado de saúde primário.
Acredito que a visão legal do problema deveria ser completamente separada da perspectiva religiosa e moral da questão. O Estado deve, quanto a mim, permitir às pessoas exprimir as suas crenças, mas não sancioná-las ou julgá-las para além das regras básicas de convivência em Sociedade. Deve permitir com total liberdade que pessoas que pensam de modo diferente relativamente a um determinado assunto possam exercer a sua vontade com igualdade. O facto de a questão e do condicionalismo religioso relativamente ao instante de início da Vida existir não deverá constituir um fardo para o Estado e para a Lei. Uma solução de denominador comum tem que ser atingida, e eu acredito que passa pelo referido critério de sobrevivência do feto. Caso haja pessoas que decidam por instantes anteriores a esse, até à propria concepção, tal deverá constituir uma decisão livre e pessoal ao seu dispôr.
Mas subsiste um ponto de vista que julgo até agora não ter sido particularmente aflorado e discutido, e que se prende com a participação do pai em todo o processo de aborto. A perspectiva comum de que "o corpo é da mulher e ela é que tem a decisão", e que "a escolha é dela" negligencia, quanto a mim, o papel e os direitos do pai em todo o processo. Apesar de todas as considerações que se possam tomar, materialmente a gravidez envolve tanto os genes do pai como os da mãe. O objecto da gravidez não é um produto exclusivo da mãe, constituíndo património genético dos dois. Defendo que também ao pai cabem direitos relativos ao curso da gravidez. Quanto a mim, deveria existir uma determinação legal que estabelecesse e obrigatoriedade de o pai ser informado da gravidez e, adicionalmente, da vontade da mulher fazer um aborto. Ao pai, assim como à mãe, deveria ser conferida a possibilidade de pedir que o aborto fosse efectuado. Caso o pai não autorize o aborto e a mulher opte por prosseguir com ele, ou caso ele peça que ele seja efectuado e tal lhe seja negado, julgo que tal deveria constituir fundamentação legal suficiente para que ele seja ilibado de quaisquer responsabilidades futuras relativas à criança (nomeadamente pensões de alimentos), bem como ser fundamentação para indeminização e/ou divórcio. Obviamente tal também seria o caso inverso, em que à mãe fosse negada a possibilidade de fazer o aborto (sendo que as responsabilidades inerentes à criança seriam automaticamente conferidas ao pai, mantendo-se o mesmo raciocínio relativamente ao divórcio/indeminização).
Em relação a Portugal, as coisas são diferentes. O problema é que, neste país, as lacunas relativas à disseminação dos métodos de contracepção, e mesmo no que toca à educação média dos cidadãos propriamente ditos são graves. O conhecimento e acesso aos métodos contraceptivos não é, para ser brando, muito disseminado e acessível. Temos uma das maiores taxas de gravidez na adolescência da Europa. Não existe educação sexual oficial. A Igreja Católica assume ainda, em termos de moral e cânone, uma forte influência na Sociedade, simultaneamente promovendo a "defesa da vida" e negando os mais básicos procedimentos de controle da natalidade. A cultura de irresponsabilidade e laxismo bem típica do português em relação à contracepção faz de Portugal um dos mercados de maior sucesso para a "pílula do dia seguinte". Simplesmente abrir a porta ao aborto livre, especialmente se for tomada em conta a possibilidade de ele ser feito quimicamente, seria simplesmente criar um novo tipo de "contracepção de emergência", ou pelo menos creio que seria visto como tal por grande parte das pessoas. Quanto a mim, tal não pode ser tolerado. As pessoas têm que ser educadas e ter capacidade de aceder à contracepção antes que se coloque semelhante escolha. Se for conferida às pessoas a possibilidade de utilizarem este "martelo", todos os problemas começarão a ser vistos como "pregos".
Isto não significa que concorde com a actual criminalização constante da Lei. O conceito de crime deveria estar, quanto a mim, restrito a quem efectua o acto do aborto, e não às mulheres que deles são vítimas. A penalização destes deverá permanecer pesada, e principalmente ser efectivada pelos senhores juízes. Em relação às mulheres, julgo que o procedimento deveria passar por uma multa, comutável em trabalho comunitário.
Até que se tenha educado melhor os nossos concidadãos, e que as estatísticas se aproximem mais dos nossos parceiros europeus, o salto não poderá ser dado, e a questão deverá ser tratada como um problema de saúde pública, devendo ser impiedosa a punição dos que aproveitam e exploram a infelicidade alheia.
colocado por JLP, 14:47