30.6.05
Sistema eleitoral II
Dando mais um passo na discussão, vou tentar dar a minha opinião relativamente às questões adicionais colocadas pelo AA neste artigo d'A Arte da Fuga, em que nomeadamente são colocadas as seguintes questões:
Proseguindo para a definição dos critérios, julgo que deveriam ser o menos arbitrários (e menos "automáticos") possíveis, de modo a eliminar as manipulações sugeridas, que são uma realidade concreta, do "tecido eleitoral". O sistema que proponho procura previlegiar a representatividade proporcional dos eleitores e das povoações, e é o seguinte:
Além disso, há uma clarificação que pretendo fazer. Este método seria somente dedicado à eleição da Assembleia da República, não interferindo directamente com a nomeação do governo. Ou seja, os deputados eleitos nos círculos uninominais não deveriam contribuir para a contabilização de totais partidários a serem tomados em conta pelo Presidente da República aquando do convite para formar governo.
Esta consideração levanta a questão de como se estabelecem os candidatos a formar governo. Julgo que tal deveria ser fruto de um segundo momento de votação, em que os deputados votariam candidaturas de indivíduos constituídas livremente de entre os deputados da Assembleia, sendo que o Presidente da República deveria considerar o resultado dessa votação e conferir ao candidato que face aos resultados achasse mais adequado a possibilidade de formar governo.
- Quantos serão os círculos uninominais?
- Como (por que critérios) serão definidos?
- Quem demarcará o mapa eleitoral?
- Quando e como poderá ser feita a sua eventual revisão?
Proseguindo para a definição dos critérios, julgo que deveriam ser o menos arbitrários (e menos "automáticos") possíveis, de modo a eliminar as manipulações sugeridas, que são uma realidade concreta, do "tecido eleitoral". O sistema que proponho procura previlegiar a representatividade proporcional dos eleitores e das povoações, e é o seguinte:
- É construida uma lista dos 100 concelhos mais populosos, ou "capitais de círculo", sendo escolhido pelo menos o conselho mais populoso da Madeira e o dos Açores.
- É em seguida determinada a área de abrangência desse círculo eleitoral, ou seja, quais os concelhos sobejantes que ficam afectos a que capitais de círculo e, como tal, compartilham o círculo uninominal.
- A solução a atingir será a que minimiza o somatório do produto do número de habitantes do concelho em causa com a distância da sua sede de concelho à capital de círculo a que fica adjudicada.
- Capitais de círculo rodeadas completamente por outras capitais de círculo não têm concelhos adicionais atribuidos.
Além disso, há uma clarificação que pretendo fazer. Este método seria somente dedicado à eleição da Assembleia da República, não interferindo directamente com a nomeação do governo. Ou seja, os deputados eleitos nos círculos uninominais não deveriam contribuir para a contabilização de totais partidários a serem tomados em conta pelo Presidente da República aquando do convite para formar governo.
Esta consideração levanta a questão de como se estabelecem os candidatos a formar governo. Julgo que tal deveria ser fruto de um segundo momento de votação, em que os deputados votariam candidaturas de indivíduos constituídas livremente de entre os deputados da Assembleia, sendo que o Presidente da República deveria considerar o resultado dessa votação e conferir ao candidato que face aos resultados achasse mais adequado a possibilidade de formar governo.
colocado por JLP, 18:10
4 Comentários:
comentado por AA, 7:18 da tarde
Caro JLP,
Estive a pensar sobre esta proposta, que me pareceu uma boa base para a discussão.
Importa que o algoritmo a adoptar seja o mais transparente possível, pelo que as suas regras deverão encontrar uma configuração final, ou várias soluções, que possam ser classificadas segundo regras também elas transparentes.
Sobretudo, é preciso evitar que as regras dêem azo a interpretações abusivas, ou sejam elas próprias causadoras de "situações de excepção".
O critério da conectividade do território do círculo uninominal é de bom senso. A única excepção admissível é nas Ilhas, onde se admite que duas ou mais ilhas sejam representadas por um único círculo (nomeadamente nos Açores, digo eu).
Tomando o caso da Região Autónoma da Madeira, verifica~se que três dos 100 mais populosos (em população recenseada) concelhos portugueses encontra-se na RAM: Funchal, Santa Cruz e Câmara de Lobos.
Estão todos situados na costa sul, em torno do Funchal. Não vale a pena ser verboso aqui: é fácil ver que uma repartição de três círculos deixaria Câmara de Lobos com a maior parte da zona ocidental da Madeira; o Funchal com a zona Norte, e Santa Cruz com Machico e Porto Santo. Mais coisa menos coisa.
Ora, é uma solução que não é elegante, porque criará dois círculos alongados (CdL e Fx), sem qualquer significado histórico e cultural (falo com alguma propriedade porque sou eu próprio madeirense).
Faria muito mais sentido uma repartição Madeira Oeste (Funchal)/Madeira Leste (Machico) e Porto Santo, por exemplo. Machico, a propósito, é historicamente a segunda cidade da Madeira, se bem que os outros dois concelhos tenham bem mais habitantes.
Ou que fosse uma distribuição tripartida da Madeira, sendo Ribeira Brava ou S Vicente a Ocidente, Funcahl ao Centro, e Machico a Oriente, com o Porto Santo.
Seja como for, é um exemplo prático que demonstra que uma solução matemática seria pouco elegante — e violentamente rejeitada pela população, governo e oposição incluidos....
Este tipo de especificidades pode ser o mote para uma repartição do país pouco transparente, como indiquei.
No caso de exemplo, Machico e Porto Santo, como um único círculo, teria hipóteses de ser socialista; com outro concelho agregado já não. Isto tem valor político e negocial...
Um abraço e cá voltarei,
AA
Estive a pensar sobre esta proposta, que me pareceu uma boa base para a discussão.
Importa que o algoritmo a adoptar seja o mais transparente possível, pelo que as suas regras deverão encontrar uma configuração final, ou várias soluções, que possam ser classificadas segundo regras também elas transparentes.
Sobretudo, é preciso evitar que as regras dêem azo a interpretações abusivas, ou sejam elas próprias causadoras de "situações de excepção".
O critério da conectividade do território do círculo uninominal é de bom senso. A única excepção admissível é nas Ilhas, onde se admite que duas ou mais ilhas sejam representadas por um único círculo (nomeadamente nos Açores, digo eu).
Tomando o caso da Região Autónoma da Madeira, verifica~se que três dos 100 mais populosos (em população recenseada) concelhos portugueses encontra-se na RAM: Funchal, Santa Cruz e Câmara de Lobos.
Estão todos situados na costa sul, em torno do Funchal. Não vale a pena ser verboso aqui: é fácil ver que uma repartição de três círculos deixaria Câmara de Lobos com a maior parte da zona ocidental da Madeira; o Funchal com a zona Norte, e Santa Cruz com Machico e Porto Santo. Mais coisa menos coisa.
Ora, é uma solução que não é elegante, porque criará dois círculos alongados (CdL e Fx), sem qualquer significado histórico e cultural (falo com alguma propriedade porque sou eu próprio madeirense).
Faria muito mais sentido uma repartição Madeira Oeste (Funchal)/Madeira Leste (Machico) e Porto Santo, por exemplo. Machico, a propósito, é historicamente a segunda cidade da Madeira, se bem que os outros dois concelhos tenham bem mais habitantes.
Ou que fosse uma distribuição tripartida da Madeira, sendo Ribeira Brava ou S Vicente a Ocidente, Funcahl ao Centro, e Machico a Oriente, com o Porto Santo.
Seja como for, é um exemplo prático que demonstra que uma solução matemática seria pouco elegante — e violentamente rejeitada pela população, governo e oposição incluidos....
Este tipo de especificidades pode ser o mote para uma repartição do país pouco transparente, como indiquei.
No caso de exemplo, Machico e Porto Santo, como um único círculo, teria hipóteses de ser socialista; com outro concelho agregado já não. Isto tem valor político e negocial...
Um abraço e cá voltarei,
AA
Caro AA,
Estive a trabalhar sobre o assunto e já tenho os resultados (constituição dos círculos e distribuição de mandatos a partir das votações das últimas legislativas) a nível nacional (continente e ilhas) para o cenário de 90 deputados eleitos em círculos uninominais, que conto anunciar e comentar por aqui em artigo brevemente.
No caso concreto da Madeira, pelas minhas contas e pelo critério de distância das sedes de concelho, o Funchal fica sozinho, Câmara de Lobos fica com Porto Moniz, Calheta, São Vicente, Ponta do Sol e Ribeira Brava e Santa Cruz fica com Santana, Machico e Porto Santo.
Há alguns resultados engraçados, como por exemplo o distrito de Portalegre não ter um único círculo.
Espero ser breve na produção!
Abraço,
JLP
Estive a trabalhar sobre o assunto e já tenho os resultados (constituição dos círculos e distribuição de mandatos a partir das votações das últimas legislativas) a nível nacional (continente e ilhas) para o cenário de 90 deputados eleitos em círculos uninominais, que conto anunciar e comentar por aqui em artigo brevemente.
No caso concreto da Madeira, pelas minhas contas e pelo critério de distância das sedes de concelho, o Funchal fica sozinho, Câmara de Lobos fica com Porto Moniz, Calheta, São Vicente, Ponta do Sol e Ribeira Brava e Santa Cruz fica com Santana, Machico e Porto Santo.
Há alguns resultados engraçados, como por exemplo o distrito de Portalegre não ter um único círculo.
Espero ser breve na produção!
Abraço,
JLP
Caro JLP,
Também eu contava desenvolver uma pequena aplicação.
A minha desculpa para ainda não ter resultados para apresentar é a constatação de não fazer muito sentido círculos uninominais atravessarem as fronteiras de distrito, sendo o "segundo voto" puramente distrital.
Assim sendo, perguntava-me se não seria mais razoável dividir o número de mandatos pelos distritos (em vez de usar o critério dos 90 concelhos mais populosos), usando um método relativamente proporcional à população respectiva. Para a maior parte dos círculos, faria sentido fazer as contas à mão.
Experimentei o método de Hondt por já ter tudo montado no Excel.
Resulta que todos os distritos têm pelo menos um deputado; mas Bragança, Guarda, Portalegre, Évora, e Beja só ficariam com um; Açores, Madeira, Castelo Branco, Viana do Castelo e Vila Real com dois. Todos estes somados não chegam ao número de mandatos do Porto (16). 1,3k eleitores contra 1,44k eleitores.
Compreenda, JLP, também eu tenho o gostinho dos algoritmos e das optimizações matemáticas, mas estou mais preocupado em adiantar as justificações políticas de quem vai propor este sistema.
Não acho absurdo que os círculos sejam definidos dentro dos distritos; é justo que sejam proporcionais à população votante. Mas há aqui uma desproporção territorial monstruosa.
Preocupa-me sobretudo como é que isto será servido aos portugueses— que não propicie a emergência do temido caciquismo, regionalismos exacerbados, descrédito da classe política.
É terreno fértil para todo o tipo de demagogias pro e contra...
Também eu contava desenvolver uma pequena aplicação.
A minha desculpa para ainda não ter resultados para apresentar é a constatação de não fazer muito sentido círculos uninominais atravessarem as fronteiras de distrito, sendo o "segundo voto" puramente distrital.
Assim sendo, perguntava-me se não seria mais razoável dividir o número de mandatos pelos distritos (em vez de usar o critério dos 90 concelhos mais populosos), usando um método relativamente proporcional à população respectiva. Para a maior parte dos círculos, faria sentido fazer as contas à mão.
Experimentei o método de Hondt por já ter tudo montado no Excel.
Resulta que todos os distritos têm pelo menos um deputado; mas Bragança, Guarda, Portalegre, Évora, e Beja só ficariam com um; Açores, Madeira, Castelo Branco, Viana do Castelo e Vila Real com dois. Todos estes somados não chegam ao número de mandatos do Porto (16). 1,3k eleitores contra 1,44k eleitores.
Compreenda, JLP, também eu tenho o gostinho dos algoritmos e das optimizações matemáticas, mas estou mais preocupado em adiantar as justificações políticas de quem vai propor este sistema.
Não acho absurdo que os círculos sejam definidos dentro dos distritos; é justo que sejam proporcionais à população votante. Mas há aqui uma desproporção territorial monstruosa.
Preocupa-me sobretudo como é que isto será servido aos portugueses— que não propicie a emergência do temido caciquismo, regionalismos exacerbados, descrédito da classe política.
É terreno fértil para todo o tipo de demagogias pro e contra...
O post está muito bom, e tem muita matéria para reflexão. Dê-me algum tempo para tentar elaborar uma resposta à altura...
Um abraço,
AA