Crítica Portuguesa

20.10.05

Independências

No seguimento da anunciada greve dos magistrados, optou o Conselho Superior de Magistratura por pronunciar-se em circular em relação à sua posição sobre a matéria, nomeadamente sobre a questão da legitimidade do recurso à greve, dos serviços mínimos fixados no pré-aviso de greve e da possibilidade de recurso à requisição cívil. Para tal não se coibiu, do alto do seu Olimpo, de proclamar votos de independência eterna (já que de outro modo seria, no mínimo, bizarra a tomada de posição), anunciado a sua impoluta orgânica institucional, em que seriam os comuns mortais exteriores à magistratura que nele teriam assento maioritário. Atente-se ao excerto do conteúdo da circular, via Verbo Jurídico (negritos meus):

Introdução

O Conselho Superior da Magistratura, órgão constitucional de gestão e disciplina dos Juízes Portugueses, tendo recebido um aviso prévio de greve para os próximos dias 26 e 27 de Outubro, apresentado pela ASJP, reuniu-se hoje em Plenário Extraordinário, no qual foi deliberado o constante da Circular n.º 148/2005, que infra se reproduz, remetida por e-mail a todos os Tribunais.
Relembra-se que o Conselho Superior da Magistratura é um órgão constitucional, composto em maioria por membros não juízes. Com efeito, nos termos do art.º 220.º da Constituição, o CSM é composto por dois vogais designados pelo Presidente da Republica; sete vogais eleitos pela Assembleia da República, sete juizes eleitos pelos seus pares, presidindo ao mesmo o Presidente do STJ. O conhecimento deste facto é relevante, na medida em que actualmente não existe auto-governo nem corporativismo da magistratura judicial, por estar reforçada no CSM a posição de componente estranha à magistratura, em que a maioria dos membros do Conselho Superior da Magistratura é estranha à Judicatura.


Por consulta ao respectivo site do CSM, foi possível visualizar a sua composição presente:

Presidente:

Juiz Conselheiro Dr. José Moura Nunes da Cruz

Vice-Presidente:

Juiz Conselheiro Dr. António Cardoso dos Santos Bernardino

Designados pelo Presidente da República:

Juiz Conselheiro Dr. Manuel Nuno de Sequeira Sampaio da Nóvoa
Dr. Guilherme Vitorino Guimarães da Palma Carlos

Eleitos pela Assembleia da República:

Prof. Doutor Carlos Manuel Figueira Ferreira de Almeida
Prof. Doutor João Calvão da Silva
Dr. Luis Augusto Máximo dos Santos
Dr. Vitor Manuel Pereira de Faria
Prof. Doutor Eduardo Augusto Alves Vera-Cruz Pinto
Drª. Alexandra Ludomila Ribeiro Fernandes Leitão
Dr. José Luís Moreira da Silva

Eleitos pelos Magistrados Judiciais:

Juiz Desembargador Dr. António dos Santos Abrantes Geraldes
Juiz Desembargador Dr. Manuel Joaquim Braz
Juiz de Direito Dr. Edgar Taborda Lopes
Juiz de Direito Dr. Rui Manuel Correia Moreira
Juiz de Direito Dr. António Fernando Barateiro Dias Martins
Juiza de Direito Drª. Maria José da Costa Machado

Como diria o outro, é fazer as contas...

Interrogo-me principalmente da motivação que terá estado por detrás da cabecinha do nosso Presidente em nomear no contingente que estava a seu cargo o elemento que de facto quebra a independência e a publicitada minoria de magistrados, afinal apenas formal, na constituição do conselho.

Além disso, assinala-se também a falta, no mínimo, de descaramento, de quem vem tapar o sol com a peneira e tentar iludir os mais distraídos, possivelmente tendo a esperança, também como dizia o outro, que a mentira enunciada em circular e retransmitida com o autismo do costume dos nossos media, de tanto repetida, se torne porventura verdade.

Sem dúvida urge repensar os mecanismos de regulação e a própria orgânica da nossa magistratura, e repensar cada vez mais urgentemente a falta de legitimidade democrática que aflige, em exclusivo nos poderes soberanos instituídos, o nosso poder judicial.
colocado por JLP, 06:35

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